sábado, 18 de maio de 2013

Editorial:



Vivemos num mundo que a cada dia decai em seus valores. Em todos os campos se sentem os sinais da decadência. Nas artes, na musica, nos costumes, na educação, na família, na política, nas leis, em tantos outros pólos a crise de valores está presente.
É tão grande, tão ampla, e tão abrangente a crise do homem, que muitos dizem que não já o que fazer, que temos de nos conformarmos com a situação e nos acomodarmos e adaptarmos a ela. Esse parar de lutar, esse conformar com a situação nos dói o coração, pois não pode nem deve haver acomodação diante do mal, mas sim luta continua e constante. Guerra sem trégua e nem mercê contra os erros, o pecado, e os modos que estão implantando no mundo um ver império infernal.
Diante das falsas opiniões, dizer não; diante dos compromissos danosos à Santa Igreja, dizer não; diante do processo que leva almas em multidões para o inferno, dizer sempre e cada vez mais não.
Resultado dessa defecção da fé e do desprezo de Deus é que atualmente tramita no Senado um Projeto de Código penal em que o terrível crime de aborto fica praticamente abolido, restando apenas a hipótese de não consentimento da gestante, efetivamente passível de punição; em que o crime de homicídio doloso através da eutanásia livra-se da sanção penal sob a rubrica antinômica da piedade e o de infanticídio perde sua importância e gravidade ao ponto de se transformar em uma banalidade.  
Vê-se que já nada podemos esperar dos poderes deste mundo e, por outra parte, a liturgia nos diz: “Nosso auxílio está em Nome do Senhor que fez o Céu e a Terra”.
Já há algumas décadas, o escritor católico francês, Jean Madiran, explicava que: “O que escutamos agora, é o ruído dos martelos que batem nos pregos, os três pregos da crucifixão. Logo, vemos as trevas invadir a terra. Depois, ainda os príncipes dos sacerdotes e os soldados tomaram a precaução suplementar de colocar a pedra que fecha a tumba. Não só colocaram a pedra como deixaram de vigia um guarda. Estes sinais nos enganam; de uma maneira ou de outra a ressurreição está próxima”.
Este argumento de nossa esperança teologal não é compreensível para alguns de nossos amigos incrédulos. Desejariam ter, ademais, razoes naturais para esperar. Mas é muito importante mostrar que a soberania de Cristo se traduz nas realidades concretas capazes de deter a guerra revolucionária, impiedosa e malsã, e inclusive de reconquistar o terreno perdido.
Cultivemos nossas faculdades superiores com a acesse, a oração, os exercícios espirituais. Peçamos a Deus os sete dons do Espírito Santo e supliquemos que se digne fazer crescer em nós a Fé, a Esperança e a Caridade.
Hoje não teríamos desculpas de não sentir essa necessidade, inclusive no plano temporal.
Cultivemos, também em nós, as virtudes da fortaleza, da temperança, da justiça e da prudência.
Alguns descobrirão, talvez, que a prudência, por exemplo, é a virtude pela qual buscamos os meios convenientes para que a ação seja eficaz em todas suas formas.
Para executar estas virtudes em todos os planos de nossa vida profissional, familiar, social, cívica, as reforçaremos em nós mesmos. Em nossa luta, lembremo-nos, especialmente nos momentos de agruras e de ataques vilipendiosos, do beato mexicano Anacleto González Flores, secular distinguido em atividades apostólicas pelos direitos de Deus e da Igreja contra a impostura laicista, assassinado aos 38 anos. Morreu gritando, com seus companheiros de martírio: “Eu morro, mas Deus não morre: Viva Cristo Rey!” Em seus últimos momentos compôs uma bela oração que ainda seguem rezando, após o rosário, as famílias cristeras:
“Jesus misericordioso! Meus pecados são mais que as gotas de sangue que derramastes por mim. Não mereço pertencer ao exército que defende os direitos de Tua Igreja e que luta por Ti. Quisera nunca haver pecado para que minha vida fosse uma oferenda agradável aos Vossos olhos. Lave as minhas iniqüidades e limpe os meus pecados. Por Tua santa Cruz, por minha Mãe Santíssima de Guadalupe, perdoa-me. Não soube fazer penitencia de meus pecados; por isso quero receber a morte como um castigo merecido por eles. Não quero lutar, nem viver, nem morrer senão por Ti e por Tua Igreja. Mãe Santa de Guadalupe acompanha em Sua agonia a este pobre pecador. Conceda-me que meu ultimo grito na terra e meu primeiro cântico no céu seja: Viva Cristo Rey!”

O espírito da Cruz


Último sermão do Padre EMMANUEL

Está página é extraída do Boletim de Nossa Senhora da santa Esperança, de março de 1903 (reeditada em Le Sel de la Terre, n. 44, consagrado ao padre Emmanuel). O Padre Emmanuel pronunciou o seu último sermão na festa da Exaltação da Santa Cruz, no Domingo, 14 de Setembro de 1902, seis meses antes de morrer. Trata do espírito da Cruz, que é “a participação do próprio espírito de Nosso Senhor, levando a Cruz, pregado à Cruz e morrendo na Cruz”.


Irmãos, há muito tempo que não me vedes aqui; não venho aqui com freqüência.
Vou falar-vos de uma coisa da qual nunca falei, nem aqui, nem algures. E essa coisa desejo-a a todos; sei bem que o meu desejo não chegará a todos. Vou falar-vos do espírito da Cruz.
Quando o Bom Deus cria um corpo humano, dá-lhe uma alma, é um espírito humano; quando o Bom Deus dá à alma a graça do batismo, ela tem espírito Cristão.
O espírito da Cruz é uma graça de Deus. Há a graça que faz apóstolos, e assim por diante. O que é o espírito da Cruz?
O espírito da Cruz é uma participação do próprio espírito do Nosso Senhor levando a Sua Santa Cruz, pregado à Cruz, morrendo na Cruz. Nosso Senhor amava a Sua Cruz, desejava-a. Que pensava Ele levando a Sua Cruz, morrendo na Cruz? Há aí grandes mistérios: quando se tem o espírito da Cruz, entra-se na inteligência destes mistérios. Existem poucos Cristãos com o espírito da Cruz, vêm-se as coisas de modo diferente do comum dos homens.
O espírito da Cruz ensina a paciência; ensina a amar o sofrimento, a fazer sacrifícios.
Quando se tem o espírito da Cruz, é-se paciente, ama-se o sofrimento, fazem-se generosamente os sacrifícios que o Bom Deus nos pede. Quer-se a vontade Deus, e ama-Se; acha-se bom o que nos pede.
Os santos queixavam-se muito a Deus que Ele não lhes dava bastante sofrimento; desejavam sofrer, por quê? Porque no sofrimento se pareciam mais com Nosso Senhor. Na vida de Santa Isabel da Hungria, é dito que, depois de a terem despojado de todos os seus bens, ainda a expulsaram de casa: quando viu que nada mais possuía, foi aos Frades Menores mandar cantar um Te Deum para agradecer a Deus por lhe ter tirado tudo. Tinha o espírito da Cruz.
A Imitação diz alguma coisa do que faz o espírito da Cruz: ama mais ter menos do que mais, ama mais estar embaixo do que em cima. Ama ser desprezado. É isto o espírito da Cruz; é muito raro.
Não o tendes muito, o espírito da Cruz. Posso bem dizer-vo-lo, há muito tempo que vos conheço, desde que estou convosco. Tende-lo menos do que o tivestes outrora.
Logo que tendes algum sofrimento, depressa dizeis: Meu Deus, livrai-me disto, livrai-me disto; fazeis novenas para vos libertardes. É preciso amar um pouco mais o sofrimento, e não pedir tão depressa para se ver livre dele. Se tivésseis o espírito da Cruz, veríamos muitas coisas que não vemos; e há as que vemos, que talvez não víssemos.
É preciso ter um pouco mais do espírito da Cruz; é preciso pedi-lo. Tratemos de amar a Cruz, de amar a vontade de Deus.
Talvez vos tenha enfastiado ao falar-vos assim, mas não vos aborreço mais.

Sermão sobre a tentação de Nosso Senhor no deserto


São Leão MAGNO

O sermão que transcrevemos, de autoria de São Leão Magno, refere-se à quaresma, “época do ano, quando nossos pérfidos inimigos redobram também a astúcia de suas manobras”, como diz o Santo. No entanto, entendemos oportuna sua publicação, sobretudo nesses tempos de resfriamento, quando não de abandono da vida espiritual decorrente do avanço, parece já evidente, sobre as nações do mysterium iniquitatis de que fala São Paulo na II Epístola aos Tessalonicenses.



Há muitas batalhas dentro de nós: a carne contra o espírito, o espírito contra a carne. Se, na luta, são os desejos que prevalecem, o espírito será vergonhosamente rebaixado de sua dignidade própria e isto será uma grande infelicidade, de rei que deveria ser, torna-se escravo. Se, ao contrário, o espírito se submete ao seu Senhor, põe sua alegria naquilo que vem do céu, despreza os atrativos das volúpias terrestres e impede o pecado de reinar sobre o seu corpo mortal, a razão manterá o cetro que é devido de pleno direito, nenhuma ilusão dos maus espíritos poderá derrubar seus muros; porque o homem só tem paz verdadeira e a verdadeira liberdade quando a carne é regida pelo espírito, seu juiz, e o espírito governado por Deus, seu mestre. É, sem dúvida, uma preparação que deve ser feita em todos os tempos: impedir, por uma vigilância constante, a aproximação dos espertísimos inimigos.
[...]
Então preparemos nossa alma para o combate das tentações e saibamos que quanto mais zelosos formos por nossa salvação, mais violentamente seremos atacados por nossos adversários. Mas aquele que habita em nós é mais forte que aquele que está contra nós. Nossa força vem d’Aquele em que pomos nossa confiança. Pois se o Senhor se deixou tentar pelo tentador foi para que tivéssemos com a força de seu socorro o ensinamento de seu exemplo. Acabas-te de ouvi-lo. Ele venceu seu adversário com as palavras da lei, não pelo poder de sua força: a honra devida a sua humanidade será maior, maior também a punição de seu adversário se Ele triunfa sobre o inimigo do gênero humano não como Deus, mas como homem. Assim, Ele combateu para que combatêssemos como Ele; Ele venceu para que também nós vencêssemos da mesma forma. Pois, meus caríssimos irmãos, não há atos de virtude sem uma batalha. A vida se passa no meio das emboscadas, no meio dos combates. Se não quisermos ser surpreendidos, é preciso vigiar; se quisermos vencer, é preciso lutar. Eis porque Salomão, que era sábio, diz: Meu filho, quando entras para o serviço do Senhor, prepara a tua alma para a tentação (Eclo. 2,1). Cheio da sabedoria de Deus, sabia que não há fervor sem combate laborioso; prevendo o perigo desses combates, anunciou-os de antemão para que, advertidos dos ataques do tentador, estivéssemos preparados para aparar seus golpes.

Uma cultura da morte


Dr. José ORLANDIS (1918-2010)

Reproduzimos um excerto do excelente artigo do jurista e sacerdote espanhol José Orlandis intitulado “Hacia uma nueva modernidad cristiana”, publicado originariamente na revista Verbo, de Madri (n. 273-274, março-abril de 1989, pp. 536-555), e que segue de grande atualidade.   


A pressão secularizadora produziu em nosso tempo conseqüências de desintegração, tanto na pessoa como na família.
O matrimonio se apresenta hoje estranhamente frágil entre aqueles que perderam o sentido cristão da vida e inclusive o respeito à alguns princípios de ordem superior, expressão da lei divina natural. É um fenômeno de patologia social essa espécie de contagio tão estendido nos últimos anos, que provoca absurdamente – e inclusive por razões banais – a ruptura do vinculo conjugal, que por instituição natural e divina é único e indissolúvel. E são degradantes e claro sinal de retrocesso cultural, as uniões ou aparelhamentos de homem e mulher – com formalidades cerimoniais ou sem elas – que desde o principio carecem de um animo de permanência e fidelidade. A dessacralização da instituição familiar – cuja expressão legal é o divórcio, o matrimonio civil, ou a equiparação com o matrimonio das meras uniões de fato – constitui, ao fim e ao cabo, um sinal de crise do amor, que não pode considerar-se progresso senão involução. Esse amor em crise, deteriorado, se envileceu ao tornar-se egoísta; se tornou mesquinho, pequeno, e incapaz, portanto, de afrontar as provas e cansaços, os tédios ou mudanças de humor que, cedo ou tarde, é fácil que apareçam na vida conjugal. Sobre um amor egoísta, que não é generoso nem fecundo, não pode assentar-se a estabilidade e felicidade do matrimonio e da família.
O estigma da secularização sobre o individuo trouxe consigo conseqüências de degradação da pessoa, que são particularmente agudas em algumas das sociedades mais desenvolvidas do mundo contemporâneo. Estas conseqüências poderiam resumir-se em uma só frase: a pretensão de “normalizar” o que é em si mesmo perverso e aberrante. Não vale a pena estender-se demasiado neste ponto. Basta evocar o grau de envilecimento a que chegou o mundo pagão da antiguidade, que São Paulo descreve com traços impressionantes no primeiro capitulo da Epistola aos romanos. Basta recordar aquele protótipo humano que hoje se quer ressuscitar e que o apostolo, faz vinte séculos, denunciava cruamente com o apelativo de “homem animal”. Mas nos vemos obrigado a fazer ainda menção de alguns dos aspectos mais salientes que apresenta este processo de decadência das sociedades modernas, que fez tabula rasa da Lei de Deus.
É degradante e sinal de decadência de uma civilização a pretensão de “normalizar” – inclusive no plano legal – as relações homossexuais, como reivindicam certos “coletivos” – assim dizem agora – que associam estas desditas pessoas. E é preciso proclamar aos quatro ventos que o homem secularizado se encontra cada vez mais imerso em uma “cultura da morte”, da que é autor, mas também vitima. A “cultura da morte” pode ter sua primeira expressão moderna nos campos de concentração da segunda guerra mundial; mas há que ter o valor de reconhecer que aquele foi apenas um ensaio, o primeiro capitulo de uma dramática historia que o homem secularizado seguiu escrevendo sem pausa nem propósito de emenda. Recorde-se igualmente que, faz só um par de décadas, o aborto era considerado na Espanha [e no Brasil], de modo praticamente unânime, como uma monstruosidade, e que hoje, em virtude dessa “lavagem cerebral”, fruto da insistente propaganda de poderosos meios de comunicação social, muitos o consideram já como coisa “de administração ordinária”; e inclusive, quiçá admire, porque são apresentados como heróis e heroínas, aqueles que, com sua violação das leis, quebraram o “tabu” e abriram o caminho para a legalização das praticas abortivas.
A “cultura da morte” começou a apresentar a eutanásia como uma deslumbrante conquista que estão alcançando já, como “pioneiras”, as sociedades mais avançadas e progressistas do mundo.
Não é possível tampouco silenciar que, ante os olhos do homem secularizado, estão se abrindo horizontes insuspeitos dos extremos a que pode conduzir a manipulação antinatural da vida e que hoje estão ao alcance das possibilidades técnicas da engenharia genética. No melhor dos casos – como escreveu com bom senso J. Visser – é uma ironia, em um tempo em que se praticam milhares de abortos, realizar “tantos e tantos gastos e esforços desnaturais para procriar uma vida humana artificial que, por muito que seja desejada por um determinado casal, apenas pode chamar-se fruto de seu amor”. Em sua inspiração mais profunda, a pretensão ultima da engenharia genética pudera ser a criação de um homem – ou de um híbrido de homem e animal -, que já não é a imagem e semelhança de Deus: a fabricação de um monstro animado, pura criatura do homem.   

Família e Direito Natural


João PAULO II

 A família é a célula primaria da sociedade. Está assentada na sólida base do direito natural, que une todos os homens e todas as culturas. Urge tomar consciência deste aspecto que me proponho seguir tratando nos próximos domingos. Com efeito, com freqüência se interpreta equivocadamente a insistência da Igreja na ética do matrimonio e da família, como se a comunidade cristã quisesse impor a toda sociedade uma perspectiva de fé valida somente para os crentes. Isto se tem visto, por exemplo, em algumas reações ao desacordo que manifestei abertamente, quando o Parlamento europeu pretendeu legitimar um novo tipo de família, caracterizada pela união de pessoas homossexuais.
Na realidade o matrimonio, como união estável de um homem e de uma mulher que se comprometem a entregar-se reciprocamente e se abrem à geração da vida, não é só um valor cristão, senão também um valor originário da criação. Perder esta verdade não só é um problema para os crentes, senão também um perigo para toda a humanidade.
Hoje, por desgraça, se difunde um relativismo que leva a duvida inclusive da existência de uma verdade objetiva. Escuta-se o eco da conhecida pergunta que Pilatos fez a Jesus: “Que coisa é a verdade?” (João 18,38). A partir deste ceticismo, se chega a uma falsa concepção da liberdade, que pretende eximir-se de todo limite ético e reformular, segundo o seu arbítrio, os dados mais evidentes da natureza.
Certamente, o homem descobre sempre a verdade de modo limitado, e pode definir-se como peregrino da verdade. Mas isto é muito diferente do relativismo e do ceticismo. Com efeito, a experiência mostra que nossa mente, ainda que esteja ofuscada e debilitada por muitos condicionamentos, é capaz de captar a verdade das coisas, pelo menos quando se trata dos valores fundamentais que tornam possível a existência dos indivíduos e da sociedade. Ditos valores se impõe à consciência de cada um e são um patrimônio comum da humanidade. Não se apela a este patrimônio comum quando condena os crimes contra humanidade, ainda quando estejam respaldados por algum legislador? Na realidade, a lei natural, precisamente por que Deus a esculpiu no coração, é anterior a qualquer lei promulgada pelos homens e é a medida de sua validade.

 João Paulo II, Meditación mañana el domingo 19 de junio, L'Osservatore Romano, edición semanal en lengua española, año XXVI, núm. 25 (1.330), 24 de junio de 1994.

Palavras para o nosso tempo:


“Tremendo mistério, e nunca assaz meditado: Que a salvação de muitos depende das orações e dos sacrifícios voluntários, feitos com esta intenção, pelos membros do corpo místico de Jesus Cristo, e da colaboração que pastores e fiéis, sobretudo os pais e mães de família, devem prestar ao divino Salvador”. Pio XII, Encílica Mystici Corporis Christi. n. 43. 29/07/1943.

“Se o Senhor não protege a cidade, inútil a vigilância da sentinela” (Salmo 126/2)

“Sede sóbrios e vigiai, porque o demônio, vosso adversário, como um leão que ruge, anda ao redor, procurando a quem devorar” (Pedro, I, cap. V, v. 8).

 "A diminuição do sendo do pecado é um sinal do esquecimento do Evangelho da Graça, que nos faz pensar que nos podemos salvar por nós mesmos e não precisamos muito do perdão. Se a mediação de Cristo é só extrínseca e não recriadora da natureza humana ferida pelo pecado, a mediação instrumental da Igreja pode parecer supérflua”. Pe. Petru Gherguel, Revista 30 dias, edição brasileira, ns. 09-10, outubro-novembro de 1990.

 “O primeiro dano que o homem sofre em conseqüência do pecado é a desordem do entendimento; o segundo é incidir na pena correspondente”. Santo Tomás de Aquino, Suma Contra os Gentios, Livro IV, Cap. LXXII, BAC, Vol. II, p. 863.

“Deus é misericordioso com os que os seguem; brandamente justiceiro com os que o ignoram; desapiedado com o que, conhecendo-o o desprezam. Por isso, colocou nas nações católicas – que os seguem – os tabernáculos de sua glória. Por isso, condenou as nações pagãs – que o ignoram – à sua vária fortuna. Por isso, reserva o socialismo, a maior das catástrofes sociais, para as nações apostatas – que o desprezam”. Juan Donoso Cortés. Carta a Maria Cristina, Obras completas, BAC, II, 1976, p. 600.

“Há vitórias que são começos de maiores derrotas! Basta atentar-se que a França consentiu, incautamente, que sua população global de 1935/38 desmoronasse de quase três pessoas por hora. Desnatalidade – é o abismo social das nações. Precisamos combater, cerradamente, na escola, no lar, na sociedade, este preconceito errôneo e funesto de que viver é gozar. Acima do prazer, está o código dever; acima do gozo, está a dignidade da honra; acima das sensações prazerosas, estão os imperativos da consciência reta; fora do hedonismo, estão o dever conjugal, o direito dos filhos, o interesse nacional. Lutemos contra mais este entorpecente social, que é o inimigo da família e da pátria”.  Marechal Petain, citado por Frei Mansueto em sua obra Pio XII, Petrópolis: vozes, p. 245.

“Esse mudo pós-moderno sem sentido é o resultado da moderna afirmação da morte de Deus, o que é dizer: nenhuma autoridade pode criar a verdade e o bem, nenhuma autoridade pode ensinar fins à inteligência e à vontade. Assim, a morte pós-moderna de todas as verdades é um conseqüente da moderna morte de Deus: ‘... hoje, a afirmação da morte da verdade imutável (que é a configuração radical da ‘morte de Deus’) tornou-se, ainda no campo filosófico, um lugar comum, um dogma’[Emanuele Severino]”. Desembargador Ricardo Henry Marques Dip. Segurança jurídica e crise pós-moderna, Quartier Latin, 1912, p. 137.

“Se agora não são tão freqüentes as aparições do demônio como antigamente, deve-se ao fato de ter crescido tanto a perversidade humana que já não necessita o inimigo de tão extraordinários meios para vencer-nos”. Martin del Rio, citado pelo Desembargador Ítalo Galli, Os direitos da moral, São Paulo, 1992, p. 64.

“Tomemos como nossa auxiliadora e intercessora a Virgem Maria, Mãe de Deus, para que ela, que desde o momento de sua concepção derrotou Satanás possa mostrar seu poder sobre estas seitas malignas, nas quais revive o contumaz espírito do demônio, juntamente com sua perfídia insubmissa e enganosa. Imploremos a Miguel, o príncipe dos anjos celestes, que lançou fora o infernal inimigo; e José, o esposo da santíssima Virgem, e patrono celeste da Igreja Católica; e os grandes Apóstolos, Pedro e Paulo, os pais e campeões vitoriosos da fé Cristã. Por seu patrocínio, e pela perseverança na união de oração, Nós esperamos que Deus irá misericordiosamente e oportunamente socorrer o gênero humano, que é rodeado por tantos perigos”. Leão XIII, Encíclica Humanum Genus, n. 37, abril de 1884.

Eu sou a Imaculada Conceição


Excertos da Bula "INEFFABILIS DEUS", do Papa Pio IX, que proclamou o Dogma da Imaculada Conceição, dado em Roma, em 8 de dezembro de 1854.

43. A nossa boca está cheia de alegria e os Nossos lábios de exultação, e damos e daremos sempre as mais humildes e as mais vivas ações de graças a Nosso Senhor Jesus Cristo, por nos haver concedido a graça singular de podermos, embora imerecedor, oferecer e decretar esta honra, esta glória e este louvor à sua Santíssima Mãe. E depois reafirmamos a Nossa mais confiante esperança na beatíssima Virgem, que, toda bela e imaculada, esmagou a cabeça venenosa da crudelíssima serpente, e trouxe a salvação ao mundo; naquela que é glória dos Profetas e dos Apóstolos, honra dos Mártires, alegria e coroa de todos os Santos; seguríssimo refúgio e fidelíssimo auxilio de todos os que estão em perigo; poderosíssima mediadora e reconciliadora de todo o mundo junto a seu Filho Unigênito; fulgidíssima beleza e ornamento da Igreja, e sua solidíssima defesa. Reafirmamos a Nossa esperança naquela que sempre destruiu todas as heresias, salvou os povos fiéis de gravíssimos males de todo gênero, e a Nós mesmos tem livrado de tantos perigos que nos ameaçam. Confiamos que ela queira, com a sua eficacíssima proteção, fazer com que a nossa Santa Madre Igreja Católica, superando todas as dificuldades e desbaratando todos os erros, prospere e floresça cada dia mais no meio de todos os povos e em todos os lugares, "do mar ao mar, e do rio até aos confins da terra", e tenha paz, tranqüilidade e liberdade completa; que os culpados alcancem o perdão, os doentes a saúde, os tímidos a força, os aflitos a consolação, os periclitantes o auxílio; que todos os errantes, dissipada a névoa da sua mente, voltem ao caminho da verdade e da justiça, e haja um só aprisco sob um só Pastor.

44. Escutem as Nossas palavras todos os caríssimos filhos Nossos e da Igreja Católica, e com sempre mais ardente fervor de devoção, de piedade e de amor continuem a venerar, a invocar, a suplicar a beatíssima Virgem Maria Mãe de Deus, concebida sem o pecado original, e com toda confiança recorram a esta dulcíssima Mãe de misericórdia e de graça, em todos os perigos, em todas as angústias, em todas as necessidades, em todas as dúvidas e em todas as apreensões. De feito, não pode haver lugar para temor ou para desespero quando ela é a nossa condutora e a nossa protetora, quando ela nos é propícia e nos protege; pois que ela tem para conosco um coração materno, e, enquanto trata os negócios que dizem respeito à salvação de cada um de nós, é solícita de todo o gênero humano. Constituída por Deus Rainha do céu e da terra, e exaltada acima de todos os coros dos Anjos e de todas as ordens dos Santos, ela está à direita de seu Filho Unigênito, Nosso Senhor Jesus Cristo, e com as suas poderosíssimas preces de Mãe suplica; acha o que procura, e não pode ficar frustrada.

45. Enfim, para que esta Nossa definição da Imaculada Conceição da beatíssima Virgem Maria possa ser levada ao conhecimento da Igreja universal, estabelecemos que, como perpétua lembrança dessa definição, fique esta Nossa Carta Apostólica, e ordenamos que às suas transcrições ou cópias, mesmo impressas, contanto que subscritas por mão de algum tabelião público e munidas do selo de algum dignitário eclesiástico, se preste absolutamente a mesma fé que prestaria à presente, se fosse exibida ou mostrada.
Ninguém, portanto, se permita infringir este texto da Nossa declaração, proclamação e definição, nem contrariá-lo e contravir-lhe. E, se alguém tivesse a ousadia de tentá-lo, saiba que incorre na indignação de Deus onipotente e dos bem-aventurados Pedro e Paulo, seus apóstolos.



Lições de Gustave Thibon


Porque sou Cristão?


Porque tenho fome de um Deus que não seja nem pura treva, nem eu mesmo, de um Ser que, embora intimamente parecido comigo, seja também tudo o que me falta.
Porque neste mundo quero abençoar tudo, sem nada divinizar.
Porque quero conservar ao mesmo tempo o olhar claro e o coração em chama.
Porque sinto que a aventura humana se dirige a algo diferente e melhor do que um desespero sem conteúdo, do que uma interrogação sem resposta, do que uma inércia vazia de sentido.
Porque quero conciliar a imensidade de amor que há em mim, com o desencanto tantas vezes provocado pela presença do homem.
Porque preciso de luz no mistério, e de mistério, na luz.
Porque quero ter, não só a força de construir e de viver, mas também a outra, que a transcende, de esperar, mesmo no desmoronamento e na morte.
Mas, se espero tudo, se creio tudo, como diz São Paulo, será apenas para tornar a vida mais suportável e para ser consolado? Sim. Também destas pequeninas necessidades pessoais se trata, quando nos sentimos ligados a todo o universo, responsáveis por todo o universo!
Na verdade, é a minha paixão do mundo que me faz cristão. É o meu respeito e a minha gratidão para com este destino que me sustenta e que se não identifica comigo.
Não me amo bastante, para escolher no céu um Deus conforme os meus desejos, mas amo bastante a vida, para não a julgar infinitamente bela, plena e justa, para não a confundir radicalmente com o Deus dos cristãos.
É como se vê, a transposição da aposta pascaliana, do sujeito para o objeto.

Fonte: "A escada de Jacob", Editorial Aster, Colecção Éfeso


Fundamento vital da liberdade

Paradoxo curioso: quanto mais enfadonhos e vazios são os "prazeres" que obtemos do pecado (e penso aqui de modo especial na luxúria), menos sabemos resistir às nossas paixões; quanto mais no desilude o nosso ídolo, mais fatal é a nossa escravidão. Mas isso só aparentemente é para admirar. O homem de prazeres mortos é demasiado pobre para ser livre. A sua vontade já não encontra, nos recursos amortecidos da sua vitalidade, o ponto de apoio, o tensor material indispensáveis para o seu exercício. A mesma ausência de tonalidade afetiva que faz incolores os seus prazeres, torna irresistíveis os seus impulsos. Aquele que julga pecar "fatalmente" (excetuo certos casos, hoje raríssimos de êxtase sexual), peca por ninharias. Um pecado verdadeiramente saboroso só pode ser um pecado profundamente escolhido. Este esfacelamento progressivo da voluptuosidade e da liberdade é, porém, a consequência normal da mecanização da humanidade. Também uma máquina é tão incapaz de escolher os seus movimentos como de neles experimentar prazer...

Fonte: “O pão de cada dia”, Editorial Aster, Colecção Éfeso.


DECLARAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO CRISTO REI DE CULTURA E CIVISMO SOBRE O PROJETO DE CÓDIGO PENAL EM RELAÇÃO AO DIREITO À VIDA.



“A garantia do direito à vida reclama o concurso da estatuição penal. Por imperativo abstrato da justiça. Por exigência concreta de defesa dos homens e da sociedade. ‘Porque a vida, disse-o Rodriguez Devesa, não é apenas o suporte biológico de uma existência individual, mas o suposto primeiro de subsistência da espécie humana’”.

Ricardo Henry MARQUES DIP[1]

“Quais são os critérios para julgar e avaliar a ‘dignidade’ e a ‘aceitabilidade’ de uma vida? A saúde? O bem-estar social ou econômico? A aceitação pela própria família, pela sociedade ou pelo vivente mesmo? Quem decidirá a avaliação e a aplicação desses critérios? Quem tem poder para decidir a vida ou a morte?”.

María del Carmen Fernández de la  CIGOÑA CANTERO[2]


I
“O mundo moderno é prostibular porque tornou negociáveis certos valores que o mundo antigo e o mundo cristão consideravam como não negociáveis”, disse certa feita Charles PÉGUY, célebre escritor e herói francês. Mais recentemente, Bento XVI, recebendo parlamentares do Partido Popular Europeu, ressaltou de forma inequívoca que a promoção da dignidade da pessoa humana, nomeadamente a proteção da vida da estrutura natural da família, constitui “princípios não negociáveis”, acrescentando que esses princípios fundamentais, requerem um consenso geral: “- a proteção da vida em todas as suas fases, do primeiro momento da concepção até o seu termo natural; - o reconhecimento e a proteção da estrutura natural da família (união entre um homem e uma mulher, tendo como base o matrimonio), defendendo-se das tentativas de tornar equivalentes formas radicalmente diferentes de uniões que na prática contribuem para desestabilizar a família, obscurecendo a sua insubstituível função social; - a proteção do direito dos pais a educar os filhos”.

II
Por isso, causam-nos apreensão os maus presságios que pesam sobre a nação brasileira com a edição do Projeto de Lei de Código Penal (PLS – Projeto de Lei do Senado n. 236 de 2012), cujo anteprojeto foi elaborado por uma comissão de juristas presidida pelo ministro do STJ Gilson Dipp, oriundo do Requerimento n. 756/2001, apresentado pelo Senador Pedro Taques.
O malsinado PLS, entre outros desvarios que fogem aos limites da presente declaração, opera uma radical alteração da natureza lesiva do crime de aborto, uma injustificável diminuição da proteção da vida humana no crime de infanticídio e despenalização da prática homicida da eutanásia.

No corpo de normas do supradito Projeto de Lei “o crime de aborto está praticamente abolido, restando apenas a hipótese de não consentimento da gestante, efetivamente passível de punição; o crime de homicídio doloso através da eutanásia livrou-se da sanção penal sob a rubrica antinômica da piedade e o de infanticídio perdeu sua importância e gravidade ao ponto de se transformar em uma banalidade, como a simples suspensão do processo”, como assinala o eminente Procurador de Justiça do Estado de Santa Catarina, Gilberto Callado OLIVEIRA[3].

Como se denota da leitura do Projeto de Lei referente às matérias acima descritas, os integrantes da Comissão responsável por sua elaboração olvidaram que a vida humana é um valor da pessoa, um bem que forma parte necessária de toda pessoa concreta junto a outros bens. É um valor ou bem igual para toda pessoa, não instrumentalizável e fundamental.

Com efeito, conforme faz notar Ramón MACIÁ MANSO, Catedrático de Filosofia do Direito da Universidade de Oviedo, “a vida deve ser respeitada e preservada porque é um bem necessário sem o qual deixaria de ser pessoa. Os atos de respeito e de preservação da vida humana não só são bons senão também de necessária posição – ação – no uso racional da liberdade, por isso devem ser realizados. Os atos de aniquilação e de destruição da vida humana, não só são maus senão de necessária omissão, não podem ser admitidos no uso racional da liberdade, por isso devem ser evitados. Há atos objetivamente bons e que devem realizar-se por sua especial bondade e atos objetivamente maus, que devem ser evitados por sua especial maldade[4]”.

Daí que – insiste o mesmo autor - “não existe nenhuma vontade individual nem coletiva, nem tampouco poder humano algum capaz de fazer que o ato de matar outra pessoa ou a si mesmo deixe de ser mal e não deva ser evitado. Tampouco existe poder nem vontade humana alguma capaz de fazer, por seu simples querer e decisão, que o ato de matar uma pessoa se transforme de mal em bom e de proibido em preceituado ou simplesmente permitido. Nem a decisão de uma pessoa nem o acordo de uma assembleia pode, pelos simples querer individual ou coletivo, anular nem transformar a bondade ou maldade objetivas dos atos nem, conseguintemente, tampouco, intervir nem modificar, de modo algum, o sentido do preceito ou proibição”.

A norma moral impõe o dever de respeitar e preservar a vida humana, toda vida humana sem exceções, desde o seu início até o seu termo natural. Diz-se amiúde, que o problema de saber qual o momento exato em que a vida se inicia, e mais concretamente, saber se o concebido e não nascido tem uma vida nova diferente da mãe e quando está começa, é um problema que só a ciência corresponde resolver.

Destarte, como acentua agudamente o jurista lusitano Mário BIGOTTE CHORÃO: “o saber científico atesta, segundo opinião amplamente sufragada e muito autorizada, que, com a fusão dos gametas, se inicia a vida de um novo organismo biológico, um indivíduo da espécie humana, autônomo e com identidade genética própria. Essa conclusão não parece prejudicada pela situação desse organismo na fase anterior à nidação (designada, por vezes, ambiguamente, ‘pré-embrionária’), nem pela hipótese gemelar monozigótica. Por sua vez, a reflexão apoiada na filosofia da natureza e na metafísica permite considerar – conforme a melhor doutrina – que o ser humano embrionário é uma pessoa, ou seja: ‘rationalis naturae individua substantia’ (Boécio); ‘individuum rationalis naturae’ ou ‘subsistens in natura rationali vel intellectuali’ (Tomás de Aquino); uma unidade substancial corpóreo-espiritual. Em suma, no momento auroral da fecundação, não é uma coisa, mas alguém – um ser pessoal –, que surge na terra dos vivos[5]”.

III
O menoscabo dos membros da Comissão pela vida da pessoa humana, considerada como um valor ou bem fundamental e que deve, portanto, se protegida pela lei positiva, não decorre ao que nos parece, apenas do desconhecimento da lei natural, senão, também, de um acentuado laicismo que visa o total rechaço de Deus e de sua divina lei da coisa pública e, por conseguinte, do direito. “Das leis, e de toda a vida oficial, toda inspiração e ideia religiosa é sistematicamente banida, quando não diretamente atacada[6]”, advertiu com pesar Leão XIII, de venerável memória.

O escárnio para com o sagrado fica evidente quando se observa na segunda parte do relatório final do Anteprojeto, que trata dos modos da codificação, a seguinte citação inicial do vetusto filósofo e jurista sergipano Tobias BARRETO sobre a origem do direito: “O direito não é filho do céu. É um produto cultural e histórico da evolução humana”.

Para confrontar o pensamento do incrédulo jurista, que para nossa tristeza é o pensamento de muitos juristas e políticos de nosso tempo, pensamento este que subjaz no bojo do Projeto de Código Penal, calha trazer à colação por sua singular atualidade as palavras do ilustre professor Frederick Daniel WILHELMSEN, catedrático de Filosofia e Política da Universidade de Dallas: “Um direito que não é estimulado e penetrado, ‘animado’ pelo direito natural, ou é ‘direito morto’ ou é ‘lei bestial’. Este direito bestial se baseia em um humanismo segundo o qual o homem não depende de Deus, senão da sociedade, sendo puramente membro de um rebanho. Mas de um tal humanismo para o bestialismo é um passo[7]”.

IV
Recentemente, com pesar foi noticiado que “o Conselho Federal de Medina (CFM) decidiu romper o silêncio e defender a liberação do aborto até a 12ª semana de gestação. O colegiado vai enviar à comissão do Senado que cuida da reforma do Código Penal um documento sugerindo que a interrupção da gravidez até o terceiro mês seja permitida, a exemplo do que já ocorre nos casos de risco à saúde da gestante ou quando a gravidez é resultante de estupro”. (Ligia Fromenti, “CFM vai apoiar o direito de a mulher abortar até a 12ª semana de gestação”, O Estado de São Paulo, 21/03/2013).

O tema é atual: em 2007, uma sessão da Anistia Internacional havia proposto para seu próximo congresso proclamar o aborto como direito humano da mulher e também propor a reforma do juramento de Hipocrates, prestado durante séculos e séculos pelos médicos.
(Margherita De Bac, “II Giuramento di Ippocrate? Vecchio, vieta l’aborto”, Corriere della Sera, Milano, 9/12/2007).

Em sua dissertação nas Primeiras Jornadas de Deontologia, Direito e Medicina, patrocinado pelo Colégio Oficial de Médicos de Madri, o veterano e infatigável lutador em prol do direito à vida, Dr. Antonio de SOROA PÍNEDA, em sua conferência intitulada “Direito à vida na Espanha e países americanos”, já no longínquo ano de 1976 vaticinava com notória lucidez: “Não estamos diante de um problema confessional, racial ou médico, senão de um movimento de escala internacional que, baseado em um tão refinado como miserável materialismo, alcançou autenticas dimensões de ‘massacre’, pretensamente justificados com a ideia de uma vida mais tranquila para os sobreviventes. Em tal corrente está se envolvendo a ciência médica, cujo fim substancial é preservar as vidas humanas”.

Ao que acrescentava em tom de denuncia que “na América, poderosos líderes em negócios macabros, com o instrumento das subvenções, fomentam desde o mais primário nível escolar a dissociação entre o prazer e a fecundidade, por meio do contraceptivo, da esterilização, do aborto e até o infanticídio, colaborando em alguns casos os serviços de Segurança Social e altas organizações internacionais: a ONU e dependentes dela, como a UNICEF, cujo fim seria, em tese, proteger a infância”.

Daí que o catedrático de filosofia Rafael GAMBRA CIUDAD, no mesmo evento, discorrendo sobre o tema “Ética e metafísica”, com clareza meridiana fez ver que Somente sobre a base de uma ética metafísica (e de uma lei natural) poderá sustentar-se uma deontologia e um código de honra profissionais, por mais que para os não crentes no Fundamento Ultimo de tal Lei se transmita legendária – e providencialmente – como o Juramento Hipocrático através de mais de dois milênios de tradição cultural”.

V
É preciso incluir neste cenário de horrores o decreto 7037/2009 que aprovou o denominado PROGRAMA NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS-3, assinado pelo então presidente Luiz Inácio LULA DA SILVA e seus ministros, entre eles, Dilma ROUSSEFF, ao tempo, chefe da Casa Civil. Sua leitura repulsiva, já que se encontram ali depravações e felonias de toda espécie, a ponto tal que pode ser considerado como o máster plano da ofensiva contra a vida reta e sã[8]. Em uma de suas ações programáticas, revestidas do título de “direitos das mulheres para o estabelecimento das condições necessárias para sua plena cidadania”, o PNDH-3 propõe “considerar o aborto tema de saúde pública, com a garantia do acesso aos serviços de saúde”. Daí a ordem programática aos legisladores brasileiros para a descriminalização do aborto: “Recomenda-se ao Poder Legislativo a adequação do Código Penal para a descriminalização do aborto” (Diretrizes 9 e 10).

Quando se começa a viver como se Deus não existisse, as más ações, outrora reconhecidas como pecaminosas – isto é, ofensivas à lei de Deus -, encontram quem as justifique, numa subversão à ética tradicional e numa visão de mundo em que a atividade humana, deixando de ser orientada para o divino e o eterno, dirige-se para os bens temporais - o prazer, o dinheiro, o poder, a utilidade social – como se fossem valores absolutos.

Nesse caso, conforme acentua o preclaro e saudoso jurista José Pedro GALVÃO DE SOUSA, não há mais obrigação moral, e a obrigação jurídica fica reduzida a uma imposição do poder público. Bem o compreendeu o romancista russo Dostoievski (1821-1881), ao dizer, em trecho famoso de sua obra “Os irmãos Karamazov”, que, se Deus não existe, tudo é permitido.

Em suma, com a morte de Deus, para usar a linguagem de hoje, tão cara à ideologia “comuno-ateísta” preconizada e defendida, embora se diga o contrário, pelos subscritores do PNDH-3 e os membros da Comissão responsável pela elaboração do Projeto de Código Penal, todos os valores e todas as normas objetivas desaparecem. Ficamos para além de todos os valores e de toda a norma objetiva. Os únicos valores e normas possíveis nessa hipótese ateísta são os valores e normas puramente subjetivos e consequentemente relativos.

VI
Nesse contexto, assiste razão ao professor Francisco CANALS VIDAL, insigne filósofo e membro da Pontifícia Academia de Santo Tomás de Aquino de Roma quando afirma que “nos encontramos diante de ações políticas em luta contra a ideia de Deus e trabalhando ativamente na ‘secularização’, no afastamento da vida humana de toda orientação eterna e transcendente, na educação dos homens para a ‘morte de Deus’ e autodeterminação de si mesmos[9]”.

Sem embargo, como diz o Professor Vladimiro Lamsdorff-GALAGANE, catedrático de Filosofia do Direito da Universidade de Granada, “a história no ensina – mas nunca aprendemos suficientemente – que uma sociedade, para subsistir, necessita de uma mínima moral social. Quiçá se viva mais comodamente sem ela, mas se vive menos tempo, por isso, há que conservá-la[10]”. E descriminalizar o aborto nas circunstancias descritas no Art. 28 do Projeto de Código Penal, eximir de pena a prática homicida da eutanásia e diminuir a proteção da vida humana no crime de infanticídio, implica descer abaixo do mínimo tolerável.

Por derradeiro, não nos resta senão fazer eco ao chamado do ilustre procurador de justiça Gilberto CALLADO DE OLIVEIRA: “é preciso, portanto, que os legisladores brasileiros, que devem pronunciar-se sobre esse projeto de lei, tenham bem presente que aprova-lo significará subverter não apenas os princípios cristãos, mas a própria ordem vigente na natureza, expressa nos princípios da Lei natural[11]”.


Toledo, 15 de abril de 2013.



       Djoni Robison Deneka Henz                                   Jean Bez Fontana
Presidente da Associação Cristo Rei                               Vice-presidente



Fernando Rodrigues Batista                                        William Fiorentin
       1° Secretário                                                            2° Secretário


“Sem o direito natural não há Estado de direito. Pois a submissão do Estado à ordem jurídica, com a garantia dos direitos humanos, só é verdadeiramente eficaz reconhecendo-se um critério objetivo de justiça, que transcende o direito positivo do qual este depende. Ou a razão do direito e da justiça reside num princípio superior à vontade do legislador e decorrente da própria natureza, ou a ordem jurídica é simplesmente expressão da força social dominante”. José Pedro GALVÃO DE SOUSA[12]

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[1] Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo; Acadêmico de honra da Real Academia de Jurisprudência e Legislação de Madri; titular da cadeira n. 42 da Acadêmica Paulista de Direito: “Uma questão biojurídica atual: a autorização judicial de aborto eugenésico – alvará para matar”.
[2] CIGOÑA CANTERO. María del Carmen Fernández de la. “Bioética y tenocracia”, Verbo, Madrid, ns. 315-316, 1993, p. 522
[3] OLIVEIRA, Gilberto Callado. Projeto de Código Penal: “Código de morte” prestes a desabar sobre a cabeça dos brasileiros, São Paulo: IPCO, 2013, p.11.
[4] MANSO, Ramón Maciá. “Las degeneraciones del poder frente ao aborto”, Verbo, Madri, ns. 215-1216, maio-junho de 1983, p. 524.
[5] BIGOTTE CHORÃO, Mário Emílio Forte. “Bioética, pessoa e direito: para uma recapitulação do estatuto do embrião humano”.
[6] Carta Encíclica Dall’alto dell’apostolico Seggio, n. 04,15 de outubro de1890.
[7] WILHELMSEN, Frederick Daniel. “El Derecho Natural em el mundo anglo-sajón del siglo XX”, conferência proferida nas “Primeiras Jornadas Hispânicas de Direito Natural” e inserida nas Actas (El Derecho Natural hispánico, pp. 224-225).
[8] Aborto gratuito, equiparação das uniões homossexuais ao matrimonio, benefícios sociais para prostitutas, mudança de sexo, identidades de gênero, esterilização, anticoncepção; ali estão todas as lacras, em um marco promotor de espionagem, da denuncia e perseguição de todos que se mostrem hostis com estas propostas..   
[9] CANALS VIDAL. Francisco. “El ateísmo como soporte ideológico de la democracia”, Verbo, Madrid, ns. 217-218, julho-agosto-setembro de 1983, p. 900.
[10] LAMSDORFF-GALAGANE, Vladimiro. “El aborto ante la filosofia tomista”. Verbo, Madri, ns. 131-132, janeiro-fevereiro de 1975, p. 72.
[11] OLIVEIRA, Gilberto Callado. Projeto de Código Penal: “Código de morte” prestes a desabar sobre a cabeça dos brasileiros, São Paulo: IPCO, 2013, p.123.
[12] GALVÃO DE SOUSA, José Pedro. “Apresentação do temário”, in. Primeiras Jornadas Brasileiras de Direito Natural: O Estado de Direito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 190, pp. 6-7.